Revista Virtual Astro-Lábio de Arte & Literaturas 2ª edição_
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22 fev (6 dias atrás)


SP22022010 - 00H54

“Um método desorganizado é diferente de uma real desorganização”

Não vi carnaval em São Paulo (salvo dois minutos de ódio assistidos pela televisão de uma banca de jornal, na Av. Paulista). Tudo parece normal pegando um ônibus e um metrô para ir onde quero. Ontem demorei duas horas de madrugada para voltar pra cá (pior do que quando morava na Penha, mas ok).

Luzes subiam pelas paredes, deslizavam pelo teto... Vermelho, verde... Uma pista lotada e o caos, sempre o caos. Que dizer? Ando pelo espaço em vão e tudo parece um labirinto, esconde-esconde, pique-pega? As pessoas dançam enquanto todo o espaço pulsa embalado por uma total aleatoriedade musical. Subo as escadas para fumar um cigarro. Gente histérica. Três meninas são abordadas por um grupo de rapazes que me pareciam uma banda de irmãos sertanejos. É constrangedor e hilário, mais ainda quando um deles fala:
- Toda mulher já nasce bissexual. Algumas aproveitam, outras não.
Tiro pela culatra e as gatinhas não caem no papo.
A noite era agradável e não iria beber nada, por nada. Uma cerveja pelo preço de um uísque e eu já tinha tomado alguns copos de vinho. Volto pra pista... Esperar até quatro e meia da manhã para pegar o metrô, andar pela rua vazia, comer um joelho chamado bauru.

É quando parece que estava fazendo as coisas de uma forma aleatória demais...
Essa cidade sugere outra organização. Mas se o método é a base das ideias, tudo pode mudar, tudo pode mudar e talvez deva.

Uma série de fotografias das coisas como elas estão postas e a sensação de nada estar fazendo. Sinto saudade de um espaço para que as coisas aconteçam, um palco para os objetos se resolverem. Leva algum tempo até que alguma coisa aconteça... Sinto-me olhando para a paisagem a espera de um terremoto. Livro, livros, livros, CDs, DVDs, roupas, móveis... Os gatos andam pra lá e para cá. O que vai acontecer? O que poderia acontecer aqui? Nem sei o que estou esperando.

Nas páginas do livro um mundo que não existe mais. Vadios, punguistas, malandros...
"Baixo-mundo, ou submundo do crime, não é necessariamente designação de determinado local de uma qualquer cidade. Designam, isso sim, o conjunto de seres humanos que nela vivem, à margem da lei ou dos bons costumes, bem como a ambiência dentro da qual os seus destinos se arrastam."
O que estou procurando?

A parede vermelha... Pela janela vejo uma maquete de proporção um pra um, exatamente de frente, um projeto de 3D. O recorte e as cores não podem existir na realidade... Dá a sensação que fazem pelo menos um novo por dia, pela quantidade de obras. Minha câmera registra um pedreiro que puxa um bloco pesado, preso por uma corda. Ele está no topo do prédio, todo paramentado, capacete, cinto, botas de pedreiro. É segunda-feira de carnaval e ele puxa mais dois blocos de diferentes tamanhos até que desligo a câmera. Gravei isso sobre algo que foi gravado sobre outra coisa, que sei lá... Nada foi digitalizado, só tenho uma fita, gravo por gravar.

O metrô não me interessa, mas é bem interessante. Em pé no meio do ônibus, nos sentimos como em um parque de diversões, é besta, mas divertido. Shopping, viaduto, concessionária, lanchonete e saio pela porta do lado esquerdo. Uma quadra antes do meu prédio uma árvore exala um perfume absurdamente forte. Jogo uma pequena pedra na guarita do porteiro, que não ouve o interfone.

Os cegos parecem andar tranquilamente na Av. Paulista, caminhando sobre um branco tapete. Em cada possível desvio os segmentos de reta se transformam em pontos e bem próximo ao meio-fio ele tem a cor amarela. Não sei exatamente em que a cor pode ajudar a um cego, mas tudo bem. Os skatistas deslizam pelo concreto.

O gato não parece gostar da gata e gosta menos ainda de não entrar no quarto, mas por sua vez meu nariz não gosta nem um pouco dos pelos dele, nem do dela. Ela gosta de tudo e dorme com a cabeça pendendo do encosto do sofá - lugar cedido para livre circulação dos gatos. Eu tenho o quarto e eles têm todo resto, já que estavam aqui antes de mim. Como em cuba escrevo com meus pés movimentando um pedal que chia e gira inutilmente uma roda sem correia, sem máquina, sem agulha e sem linha.
Um CD atrás do outro. "Quanto mais noise, menos atrapalha".
Ele não gosta de nada que ela faz. (miado de reprovação). Ela fica blasé enquanto ele parece detestar tudo.

Eu vou embora de São Paulo e não te vejo mais.
Eu não vejo o Rio de Janeiro, eu não vejo a praia.
Eu não quero ver o por do sol na praia.

Vou até o centro para comprar filmes fotográficos. Antes disso, caminho pela rua e entro em um prédio, subo as escadas. Em uma das salas encontro três carteiras de madeira, em cada uma, uma máquina de escrever. Sento na da direita e folheio os papeis datilografados rudimentarmente. Leio:
"QUERO VER O POR DO SOL DA PRAIA".
Escrevo uma carta para ela, sei lá por quê? Um total absurdo. Finjo-me poeta e escrevo uma carta. Coloco minha folha de papel misturada às outras, substituindo-a por uma nova onde escrevo em caixa alta:

ESCREVA







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lml

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